segunda-feira, 14 de agosto de 2017

A visão do mundo.


Em 1976, tudo o que eu entendia por mundo havia se modificado, esse era o meu último ano na Casa da Infância e a angustia de me afastar do meu lar me consumia.
Eu, o Fabiano, o Valdir Lustosa e o Hélio combinamos que, mesmo em pavilhões separados, no Educandário Dom Duarte, jamais deixaríamos de nos encontrar, nossa amizade atravessaria os confins do infinito, essa promessa fora feita no pátio do São José, com toda a pompa que a ocasião merecia.
Ir embora da minha casa, não sendo mais a pessoa que eu havia sido, me tirava o sono...alguma coisa havia me tirado do contato com o menino que eu era em 1969 e, eu não podia atinar o que podia ser.
Quando eu estava no segundo ano de colégio, no pátio do Nossa Senhora, houve um mutirão de extração de amídalas, todos os meninos, com exceção dos mais velhos sofreram a cirurgia.
É lógico que o tratamento consistia em repouso e muita gelatina e sorvete na dieta, para que os pontos se cicatrizassem, a alimentação era ótima, mas o repouso me agoniava.
Subindo na cabeceira da cama, com esforço, se alcançava a janela gigante vidrada e se tinha a visão do mundo, a igreja matriz, um pedaço da avenida Nazareth e um pedaço do pátio do São José, os meninos gritavam e seus gritos nos alcançavam.
Essa era a visão do meu mundo, da minha visão de casa.
Voltei ao presente e estava me trocando para sair com meu padrinho, para passar as festas de fim de ano.
Quando estava já arrumado, fui à janela e lancei um olhar para fora, o prédio da administração me impedia de ver a imagem completa do mundo, talvez fosse essa, a resposta.
Corri e desci a escada, no primeiro andar, entrei no segundo dormitório e ele estava vazio, agora eu não precisava mais subir na cama, encostei o nariz na janela e lá estava a visão do começo, perfeita.
Certo de que o mundo era o mesmo, desci para a portaria, confiante que, o que viesse não me assustaria.