Parte de se viver órfão, era a solidão de não ter
uma família, alguns vão usar isso como desculpa para não conviverem em
sociedade e se estagnarem nesse mundo e, como consequência, nunca
estarão completos, sempre a desculpa de não serem amados na infância.
O Educandário Dom Duarte não atendia só aos órfãos, grande parte dos
internos tinham famílias e as viam em fins de semanas, quando não,
tinham sempre os domingos de visitas, as famílias que não tinham condições de buscar o interno, compareciam nesse dia e armavam seus banquetes no gramado, do lado oposto do campão.
Bom, o órfão tinha uma única visita, o João do Bode.
Esse notório personagem, era um crioulo alto de sorriso fácil e alma de
anjo, não sei se foi promessa ou, simplesmente o sentimento de
voluntariedade que o impelia a ser um afro-Papai Noel dos meninos.
Alguns contam que ele havia sido interno da Casa da Infância do Menino
Jesus e, por ser órfão, não recebia visitas, fora lá, por compensação,
que ele havia começado, em domingos de visita e natal, a distribuir
doces aos poucos que ficavam no colégio.
Então, ele compensou a tristeza da infância, passou a ser a visita de quem jamais teria.
Alguém sempre vai supor que, para tal empreitada, um sujeito tem que
ter muito dinheiro, o João não parecia, pelas roupas que vestia, ser um
sujeito de muitas posses não, ele comprava uma parte e arrecadava com
amigos e comerciantes, juntava tudo num grande saco e distribuía.
Quando me mudei para o Educa, percebi que o João do Bode chegava
regularmente às 14:00 horas, de qualquer canto que se estivesse, o grito
ia passando, de boca em boca:
_O João do Bode chegou.
E, como
se fossem tambores, quem estivesse em lugares distantes, saberia da
notícia e corriam ao encontro, os meninos que estavam com suas famílias
também corriam, de longe se podia ver a cena, um homem grande correndo,
seguido por dezenas de guris.
Claro que os doces eram bons, isso conta no final da história, porém, para alguns internos, essa era a única visita.
Viva sempre, João do Bode, um homem simples, de atitude gigante.