segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Uma aventura na Bertioga.


A Olga era a moça que tomava conta do pátio do Sagrado Coração, rosto suave, cabelos longos e louros, boca pequena e olhos de um castanho quase verde, dona de uma beleza de tirar o fôlego..., porém, se eu quiser ser fiel ao pensamento da criança que eu era em 1973, tenho que retirar toda a descrição que acabei de fazer.
Calma, que me explico já.... Na cabeça de um menino de sete anos, a consideração de beleza é muito relativa, a beleza, obrigatoriamente, tem que ser acompanhada da bondade.
Bondade era uma coisa que a moça não tinha, portanto, no critério dos meninos, a moça não era bonita, era um canhão.
Outra coisa, para essa aventura trocaremos o cenário do prédio da Casa da Infância do Menino Jesus, no emergente bairro do Ipiranga e vamos à bucólica Bertioga, uma praia que, por esse tempo, era o paraíso na terra.
No mês de janeiro a turma reduzida, por conta das férias, descia a Serra do Mar e se alojava numa escola municipal, nas salas, todas as carteiras eram amontoadas num canto e se armavam os beliches de lona, parecidas com as do exército.
Nos quadros, ao lado da lousa, ainda ficavam expostos os trabalhos de sala dos alunos e com as notas, o pátio de recreio virava uma enorme sala e a cantina virava cozinha.
A escola era enorme e murada, no mato crescido da área de lazer, vaga-lumes voavam e a lua chegava bem perto, acima da montanha que ficava ali pertinho.
Meu amigo mais comum era o Fernandinho, sempre, a corda e a caçamba, nessa aventura, o Oscar se juntou à nós.
O Oscar era um guri albino, muito branco na pigmentação e para enxergar bem, tinha que se aproximar muito das coisas, em contraponto, era de nós, o mais esperto, o que tinha maior presença de espírito, para usar um termo atual...o mais descolado.
A turma era tão reduzida que não se usava o critério das divisões de pátios, todo mundo junto, nem todas as moças iam para o passeio e, para nosso azar, depois de um ano aguentando a Olga, ela foi conosco.
Uma coisa que merece nota, em janeiro de 1974, a rede Globo estreou o programa Fantástico, aquela abertura que tinha a Clara Nunes e os Secos e Molhados, assistimos em Bertioga.
Me lembro de ter dito:
_. Ah, que lindo. Logo depois, o trio correu à caça dos vaga-lumes na noite escura.
A praia ficava a menos de 1 quilometro da escola, Bertioga era uma cidade interiorana, à medida que chegávamos mais perto, o barulho do mar aumentava.
As freiras vestiam maiôs e pediam para que, não disséssemos a ninguém que eram freiras, ora, os maiôs eram tão grandes que, era como se elas estivessem vestindo seus hábitos.
Brincando de castelo de areia, eu o Fernandinho e o Oscar percebemos que um jovem aproximou da Olga, o jovem, encantado com a beleza da moça, investiu.
O cara tinha boa presença e a moça se derreteu toda.
_. Por que você está sozinha??
_. Estou cuidando dos meus sobrinhos.
_. Ah, você é um anjo que caiu do céu.
A sobrinhos, ela se referia a nós, dois guris pretos e um albino, aproximou-se do trio e passou a nos acariciar, aquela bandida e, o trouxa caindo como um patinho.
Ainda que ele quisesse, ela não permitiu que fosse beijada, ela olhava disfarçada para o resto dos meninos e as freiras.
Quando as freiras resolveram voltar para a escola, ela se despediu do laranja, digo jovem, pegou na minha mão e fomos todos, numa relativa distância do grupo, quando ela se certificou que já estava longe, soltou a minha mão, o Oscar ria e esfregava as mãos.
Mais tarde, ela deu desculpa que ia num mercado, para que não desse na vista, pediu para levar o trio, para nós tudo bem, era hora do repouso e, junto do jovem Romeu, fomos conhecer o forte de São João, que beleza, nós vimos, a moça não, estava ocupada e com os olhos fechados.
O rapaz tinha uma moto e queria se exibir, deu cavalinho de pau, pulou umas rampas, acelerou e freou.
Agachado, catando conchinhas não percebi a aproximação da moto e fui atropelado.
Atropelado é força de expressão, eu cai e o pneu dianteiro passou em cima do meu braço, nem doeu e nem marca deixou, correram os meninos para me socorrer, o Oscar chegou primeiro e antes que eu me levantasse, ele disse:
_. Não, não levanta não.
Eu ia dizer a ele que não havia acontecido nada, ele me segurou no chão e gritou:
_. Olha aí, quebrou o osso, a madre Marcia não vai gostar nada disso.
O Fernandinho que não era bobo, me ajudou a levantar e já ensaiava um choro, o rapaz estava branco feito uma vela e a moça tremia feito vara verde.
Aí foi que o passeio ficou bom, até de Bugre nas areia eles nos levaram, pela primeira vez na vida, experimentamos o gosto de um bom Sunday.