sábado, 8 de abril de 2017

Quebra da ordem estabelecida.


Se acordava e entrava na fila da pia, seguia-se a fila para descer as escadas e tomar o café, entrava-se na fila para a classe, uma fila para o recreio...se seguia uma rotina de filas, até a hora de dormir.
Para tudo, se seguia em fila, uma ordem estabelecida sempre, muitos dos interno que foram para o Educa, ao se verem em campo aberto e livres das filas, se perderam.
Uns se retraíram, uns se expandiram, uns soltaram a franga e outros enlouqueceram mesmo.
Quando haviam os passeios, a rotina era quebrada e, ainda que em alguns deles se seguissem as filas, dava para se divertir.
Em 1974, quando se inaugurou a primeira linha de Metrô do Brasil, em quase todos os fins de semana, íamos para o centro e passeávamos nos trens de graça.
Os passeios da Casa da Infância, em geral, eram muito divertidos...haviam os programas de televisão ou as idas à Bertioga, quase não dava para as freiras ou as moças segurarem o ímpeto dos meninos, todas terminavam em sermão, por conta de algum guri que acabou se empolgado demais.
Haviam os passeios mais curtos, pelo bairro mesmo...tipo ir ao museu dos bichos, desse eu não gostava muito, bichos empalhados nunca me agradou, quando passeávamos no Instituto padre Chico, era uma festividade e o pessoal de lá, apesar da deficiência, tinham um astral muito bom.
Em algumas sextas-feiras, saíamos com a tia Herotildes e, cada qual com uma nota de 1 cruzeiro, tentava economizá-la ao máximo, isso fazia parte do aprendizado da terceira série.
Agora, o campeão de todos os passeios era mesmo o do Museu do Ipiranga, essas visitas me fizeram fanático por história.
Num desses passeios, vi quebradas todas as regras do rigoroso sistema das freiras.
Era sempre agradável percorrer a distância a pé, conosco estavam as madres Márcia e Brasil, além da moça Sonia.
Depois de constatar que o museu estava sofrendo reformas e não seria aberto ao público naquele dia, tiveram ideia de visitar a tia Cecília, professora da primeira série (minha madrinha), que morava na rua Bom Pastor.
A tia Cecília, que era filha de japoneses, nos recebeu de braços abertos e enquanto ela nos preparava pasteizinhos, ficamos assistindo "japan Pop Show" com o simpático Carvalho, marido dela.
No melhor da festa, as nuvens começaram a se carregar e, nos despedimos da professora, que morava na parte de cima da papelaria Carvalho e, como precisávamos andar acelerados, não carecia de fila.
Na verdade, entre as nuvens negras e o temporal, foram alguns poucos minutos e a gente havia percorrido alguns quarteirões, uns quatro.
Nos abrigamos no toldo de uma fábrica, era chuva de vento e assim mesmo estávamos nos molhando, uns 10 guris, as freiras e a moça.
De frente para a rua, pudemos ver que enquanto a chuva prosseguia, a água voltava e inundava a rua, uns quatro degraus acima do nível da rua, estávamos protegidos.
O tempo passava e nada de diminuir a chuva que caía em cântaros, o vento gelava e trazia mais água.
Na rua, um grupo de meninos que vinham das ruas de cima, só de calções, passaram a pular na piscina que a chuva havia formado, alguns vinham correndo no asfalto e se jogavam, espalhando as águas, chuva aumentava e o grupo crescia, garotos de variadas idades gritavam, um guri de uns quinze anos notou a nossa presença e, mesmo vendo os adultos, passou a nos chamar para a farra, fizemos sinal que não podíamos e ele insistiu em chamar.
A Sonia deu de ombros, a madre Márcia, que tinha olhos dum azul profundos, ficou tentada a autorizar, mesmo assim deixou a decisão para a madre Brasil.
Ah, deixar para a madre Brasil foi como dizer amém, ela disse:
_Tirem as camisas e os Congas e tomem cuidado.

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