quarta-feira, 28 de junho de 2017

3 atos do teatro do Educandário Dom Duarte.


   Esse prédio em estilo colonial guarda uma magnífica imponência de quem, parado, caminha com os sonhos de quem pisou em seu interior.
   Chorei, quando morreu o "Menino da porteira" e, tive cólicas ao rir do inesquecível Mazzaropi e sua espingarda de cano torto.
   _Pra quê Mazzaropi???
   _Pra pegar veado na curva.
   Quando descia a estrada do 14, meu lar, ele se avizinhava, crescia, conforme a caminhada e vinha para mais perto, pragmático que sempre fui, não seguia a estrada como todo mundo, fazia a volta nos buchinhos e ficava do lado dele, por vezes nem olhava e podia sentir a presença daquela colossal obra de arte, depois arrancava uma folha do jardim arredondado, punha no bolso e partia para a aventura de viver.
   Minha memória guarda muitas tardes, bem colado à coluna direita, folheando livros ou, só sentado na escada, ouvindo a passarinhada em seu canto.
   A minha relação com o teatro daria um livro, cada aventura, só selecionei três delas e, em tempos distintos.
   Em 1978, ainda fazendo parte do sexteto, trouxemos um enorme cacho de bananas e o escondemos naquela vala que ficava ao lado do teatro, servia para conter as águas do barranco e evitava o desmoronamento, na ausência das chuvas, virava esconderijo para os meninos.
   Enquanto dois tratavam de acomodar as frutas na vala, dois buscavam capim e folhas secas e os dois últimos ficavam na parte alta, "manjando cana", os cachos de bananas do 14 eram gigantes, um guri de 11 anos não poderia carregá-lo sem ajuda, a vegetação seca tinha duas utilidades, esconde e forçar o amadurecimento, essa manobra exigia vigilância, os chupins estavam por todos os lados e, qualquer movimento suspeito levaria à caça de outro esconderijo.
   Tudo pronto, agora era procurar uma brincadeira ou aventura, livres do estado de alerta, iniciamos a subida do barranco que ia dar na estrada do 15, quem sabe, a gente pudesse encontrar algum menino do 17 para rivalizar.
   Há meio barranco escalado, ouvi acordes de violão vindo às nossas costas, dentro do teatro, alguém dedilhava uma suave melodia, os outros meninos continuaram a subida e eu estaquei.
Ah, a música e eu, isso é uma parte que já cansei de escrever.
   Desci e não vi mais os amigos, a porta do fundo tinha um segredo, soltei uma parte das divisórias da porta sem fazer barulho, entrei no buraco e o fechei atrás de mim, fui esgueirando ao lado do palco e fiquei no escuro da plateia, de joelhos, para ninguém notar a minha presença.
Era um ensaio, o Luís Antônio do 14 tirava o som do violão, as filhas da dona Tereza do 22 faziam as vozes de acompanhamento, a primeira voz ficava à cargo do Jordão.
   ..."Vou voltar, sei que ainda vou voltar, para o meu lugar"...
   A voz das meninas (Rita e Cuca) era um misto de sofrimento e esplendor, o Luís Antônio era um artista completo, tocava a melodia do Tom Jobim com acordes hora de Chorinho e hora de fado e o Jordão...o que é que ainda eu posso dizer desse gigante???
   Presenciei essa maravilha sem poder me mostrar, ao fim da audição, eles se aplaudiram e cumprimentaram-se, detrás de mim vieram umas palmas entusiasmadas, o Zezinho da cozinha se levantou e gritou:
   _BRAVO.
   Correu ao palco e ficou com os amigos, do palco o Luís Antônio gritou para a plateia:
   _E aí moleque, gostou???
   Eu não respondi nada, a beleza tem o dom de me calar profundamente.

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