segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

Vá além

  Imagina agora um país, onde o direito de manifestação popular é proibido por lei, o cenário é o Largo da Batata, Pinheiros-São Paulo.
Por medo, o comércio cerrou as portas, um grupo de trabalhadores vai tentar o que, por anos era impossível, no bolo, as quatro fileiras da frente são compostas de estudantes, quase crianças.
A intensão era a de percorrer o bairro todo, mas ali, entre os pontos de ônibus, a tropa de choque barrou-lhes o caminho, a ordem é dispersão total.
Os cavalos relincham e batem os cascos contra o asfalto, esse atrito causa faíscas.
O grupo se nega a sair, os policias começam a entoar uma canção, uma canção de terror, na marcha, seus coturnos fazem o compasso e, o que sai de suas bocas parece uma evocação, o segundo compasso é de seus cacetes contra os escudos.
Linha de frente, não há como recuar, só o consolo de que vai acabar logo, aquela canção gela os corações dos meninos, em poucos segundos a avalanche vai os calar.
Uma menina mirradinha está ao meu lado, nunca a ouvimos falar, inacreditavelmente ela começa a cantar:
"Não sei andar sozinho por essas ruas, sei do perigo que me rodeia"...
A voz da menina é débil, precisa de ajuda, eu conheço a canção e vou também, mas essa, todos os meninos conhecem.
Surpreendidos, os policiais se calam e "Você parece comigo, nenhum senhor te acompanha" sai aos gritos.
Antes da marcha há um silêncio ensurdecedor, homens e cavalos partem para cima do grupo e o escuro se faz.

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