quarta-feira, 1 de março de 2017

A aposta


Sempre vou afirmar que a Osvaldão era a rua das mulheres guerreiras, não é, nem nunca será exagero.
Duas Zulmiras, uma vinha de tarde do serviço e tinha um monte de filhos, a quem sustentava sozinha, essa Zulmira, magrinha com um olhar quase infantil e força de leoa na defesa de suas crias, a outra era mais velha e todos chamavam de dona Zulmira, a mesma história, sozinha a criar uma penca de filhos, essa ralhava com os meninos que brincavam com bola na rua porquê na frente de sua cerca cuidava das rosas e, em tempos de Cosme e Damião, dava doces para elas.
Criar os filhos, plantar rosas e dar doces, não é para qualquer um...ah, não é mesmo.
Quem passava de ônibus, subindo a João de Lorenzo e via aquele pedaço de rua, não fazia ideia de que um universo cabia naquela rua quase insignificante.
Os homens eram todos amigos e o ponto de encontro era no bar do Vô, um orelhão que servia a todos, ficava bem na porta e o número dele constava em todas as fichas dos moradores, era 810 3014.
Numa bela tarde de domingo, ninguém entendeu o fato de o Francisquinho ter sido carregado em triunfo, aplaudido e ovacionado, o motivo ninguém contou, nem para as mulheres nem para as crianças.
O Francisquinho e o Vô eram os mais velhos da rua, totalmente diferente um do outro e, assim mesmo, eram amigos.
Já disse que o pai da dona Maria cabeleireira contava causos de sua terra Ipiaú e o fazia como se declamasse um livro de cordel, quando contrariado, soltava a frase imortal.... Esta não, esta não.
O Vô, que também era chamado de Véio Dila, gostava também de histórias, as melhores histórias dele eram de presídio, ele havia cumprido pena em Ilha Grande e, na mesma cela de Gregório Fortunato, o Anjo negro, braço direito e amigo pessoal do presidente Getúlio Vargas.
Entre esses dois, a resenha era garantida e muitas risadas também.
Nesse domingo memorável o Vô chamou o Francisquinho de enrolador, ele, feito um galo de briga, subiu na mesa de bilhar e disse desaforos, claro que ambos bradavam e riam ao mesmo tempo.
Assistindo a pendenga, estávamos, eu, o Hamilton taxista, o Maurício, o Carmelo, o Paulo e o Clóvis, os últimos três, além de moradores, eram vigilantes do cemitério Israelita.
O motivo da discussão...todo mundo sabia que o Francisquinho, que já tinha mais que 80 primaveras, tinha um rabicho com a Mineirinha que, não tinha uns 30 anos.
Na opinião do Véio Dila, aquilo era só fantasia, na verdade, o baiano não dava contado recado, usando as palavras dele:
Só fogo de palha.
Ao que, o Francisquinho havia demonstrado ter ficado muito ofendido, gesticulava e falava alto, quando alguma mulher ou criança passava na rua, ele disfarçava, não me lembro de um dia ter dado tanta risada na vida.
O Vô sugeriu e todos toparam a aposta, cada qual com uma quantia e se casou o dinheiro, nesse instante, entrou na rua a mencionada Mineirinha, todos apostaram contra o baiano, só eu fui a favor dele.
Para que desse certo, o Francisquinho tinha que se esconder, ele entrou e se escondeu no balcão do bar, o Véio Dila fez sinal para a moça, ela parou e ele tascou a pergunta:
_Mineirinha, o Francisquinho dá no couro????
Todos os outros fizeram que não ouviram a pergunta, a Mineirinha respirou, coçou a cabeça e, não se limitou ao simples sim ou não, disse:
_. Uai sô, aquele véio tem mais fogo que esses meninos mudernos.
A cara do Vô foi ao chão, o baiano saiu do balcão glorioso, nessa hora eu já havia caído no chão de tanto rir.
Todo mundo dando vivas ao Francisquinho e a coisa ficou pior, derrotado, o Véio Dila deu um beijo nele, disse que ele era o seu herói, o Francisquinho afastou o amigo de si e disse:
_. Esta não.

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